setembro de 2023 Bocage Bocage ficou para a história, sobretudo, como poeta satírico, burlesco e erótico. Com o tempo, tornou-se sinónimo de rebeldia, boémia e de histórias obscenas. Irrefutável é que produziu dos mais belos poemas líricos da língua portuguesa, já que a preocupação com a métrica, com a estruturação do poema e a cuidada seleção vocabular consagram os sonetos de Bocage - o grande poeta do Arcadismo em Portugal - como verdadeiras obras-primas, para muitos estudiosos, ao nível de Camões e Fernando Pessoa. Manuel Maria Barbosa du Bocage nasceu em Setúbal, junto ao rio Sado, no dia 15 de setembro de 1765, filho de um juiz de fora e ouvidor e de uma descendente de família da Normandia, França, e faleceu em Lisboa, no dia 21 de dezembro de 1805, apenas com 40 anos. Em 1783, alistou-se na Marinha de Guerra, embarcando para a Índia três anos depois, onde foi promovido a tenente e mandado para Damão, desertando passado pouco tempo. Ao fugir da Marinha, viveu em Macau e de lá regressou a Portugal, em 1790. No regresso à Lisboa, escreveu versos sobre a desilusão amorosa – inspirado pela paixão que nutria, desde adolescente, por Gertrúria, que viria a casar-se com o seu irmão – e lançou-se numa vida de boémia e dificuldades financeiras, que sempre o perseguiram. Com o pseudónimo de Elmano Sadino, participou na associação de poetas denominada “Nova Arcádia”, que surgiu em Portugal, em 1790, escrevendo poesias que falam de pastores, de rebanhos e da mitologia clássica. O próprio nome do movimento faz referência à Arcádia, região da Grécia onde, segundo a mitologia, pastores e pastoras levavam uma vida inocente e feliz, em contacto com a Natureza. Em 1797, sobretudo devido ao poema Carta a Marília”, Bocage recebeu ordem de prisão. Com ideias de liberdade e à frente do seu tempo em várias questões, acusado de impiedade e antimonarquismo, foi condenado e passou meses nas masmorras do Limoeiro, da Inquisição, no claustro de São Bento e no convento dos oratorianos, até se conformar, aparentemente, com as convenções religiosas e morais da época e se retratar. Trecho do poema Carta a Marília: Pavorosa Ilusão de Eternidade, Terror dos vivos, cárcere dos mortos; D’almas vãs sonhos vão, chamado inferno; Sistema de política opressora, Freio que a mão dos déspotas, dos bonzos Forjou para a boçal credulidade; Dogma funesto, que o remorso arraigas Nos termos corações, e a paz lhe arrancas: Dogma funesto, detestável crença, Que envenena delícias inocentes! (...) De regresso à liberdade, como meio de sustento, dedicou-se à tradução de autores latinos e franceses, tarefa que exerceu com grande qualidade. A par da sátira desbocada, Bocage desenvolveu uma veia amorosa, retratando os seus dramas existenciais numa linguagem emotiva que gerou grande recetividade e popularidade. O ciúme é a tónica de muitos versos, refletindo a sua insegurança em relação à pessoa amada. Bocage foi pré-romântico no gosto pelo mórbido, no uso de palavras altissonantes, nos recursos a interjeições, reticências e apóstrofes. A sua poesia individualista e pessoal foi uma antecipação do que seria a poesia romântica do século XIX. Convite à Marília Já se afastou de nós o inverno agreste Envolto nos seus úmidos vapores; A fértil Primavera, a mãe das flores, O prado ameno de boninas vestes: Varrendo os ares o sutil nordeste Os toma azuis; as aves de mil cores, Adejam entre Zéfiros, e Amores, E toma o fresco Tejo a cor celeste: Vem, ó Marília, em lograr comigo, Destes alegres campos a beleza, Destas copadas árvores o abrigo: Deixa louvar da corte a vã grandeza: Quanto me agrada mais estar contigo Notando as perfeições da Natureza! Além de sonetos, Bocage compôs elegias, odes, fábulas e cantatas. Escreveu, também, epigramas e sessenta e nove sonetos satíricos nos quais a caricatura é marca fundamental. Publicou em vida Rimas (1791-1804), em III volumes. Na edição de VI volumes, já de 1853, intitulada Poesias, foi reunida a sua melhor obra, incluindo as traduções de Ovídio e Jacques Delille. Ao longo do tempo, são inúmeras as edições da poesia de Bocage e de estudos sobre a sua vida e a sua escrita. Fonte: https://www.ebiografia.com/bocage/ Voltar!